Heavy Rain se tornou um jogo icônico em parte por seu potencial dramático. Na época de seu lançamento era comum ser chamando de "filme interativo" por alguns entusiastas. O trabalho da Quantic Dream se direciona muito para trazer uma experiência emocional junto com o jogo, e essa tentativa é através da busca do máximo de realismo nos personagens, cenários, história etc. Desse modo, é normal que a empresa use e abuse de recursos cinematográficos em seus títulos.
Como muitos já sabem a história gira em torno do desaparecimento do segundo filho do protagonista, sequestrado por um assassino serial, o Origami. Mas antes disso somos apresentados à sua bela família: uma esposa linda e dois filhos alegres. Todos vivem em uma casa grande, com um quintal enorme e luxuosas portas de vidro. O pai é um arquiteto e podemos até trabalhar em um de seus projetos, no seu escritório. Interagimos com cada membro da família e vemos como tudo é colorido e feliz. Nesse dia nos preparamos para o aniversário de dez anos do filho que parece ser o mais velho. A primeira cena do jogo ensina os controles ao mesmo tempo em que faz uma apresentação inicial dos personagens, como a introdução de um filme.
Casal feliz |
Passeio desastroso
A segunda cena começa igualmente alegre, com o núcleo família-modelo indo ao shopping junto, crianças brincando ao redor da mãe, pai carregando um dos pequenos em cima da cabeça, sorrisos para todos os lados. Mas sabemos o tempo todo que mais cedo ou mais tarde algo ruim vai acontecer, afinal é uma história sobre um sequestrador assassino. Ficamos o tempo todo à espera de um desastre, só não sabemos qual é.
A mãe então resolve comprar sapatos para o mais novo e pede ao pai que cuide do outro, e que "não o deixe sair de perto". O menino some nos primeiros segundos, mas tudo bem, ele só queria ganhar um balão. Está parado em frente ao palhaço vendedor de bolas coloridas e ignora a bronca do pai que o avisa para não sair de perto. Neste momento a interpretação estereotipada e artificial do menino pedindo um balão para o pai "por favor, por favor" e a sua alegria desproporcional por escolher o vermelho quase encerram o drama da cena e a tornam uma comédia por alguns segundos.
Os controles de Heavy Rain são um tanto especiais. Com o objetivo de trazer uma imersão maior pelo controle de cada movimento do personagem, cada ação, mesmo que pequena, leva movimentos simulados da realidade. Enquanto o protagonista paga os balões, o filho já sai andando, e ele tem que procurar o dinheiro pelos bolsos, um por um, mexendo o direcional pra lá e pra cá, até acertar. No último, claro.
Com essa demora, o filho sumiu. Procuramos por um baixinho com um balão vermelho no alto da cabeça. A música fica tensa e ouvimos o rítmo de batidas aceleradas do coração. O botão que mostra o pensamento do personagem tem apenas uma opção: gritar o nome do filho o tempo todo. Podemos entrar em lojas, esbarrar nas pessoas, mudar de andar... Se não fosse o pequeno desespero que o jogo impõe poderíamos apreciar o quanto aquele cenário é grandioso, com várias lojas que não são apenas um plano pintado, mas lojas completas que podemos entrar e ver produtos diversos. Além da multidão de pessoas com rostos e roupas diferentes.
Avistamos um balãozinho vermelho no primeiro andar, perto dos brinquedos, corremos e nos deparamos com o filho de outra pessoa. Vemos o balão real então do outro lado, o menino resolveu sair do shopping. Corremos atrás dele e vemos a cutscene.
Jason, um menino de dez anos, atravessou a avenida sozinho e pelo visto não tinha muito discernimento. Assim que viu o pai desesperado na porta saiu correndo e atravessando a avenida com várias faixas e foi imediatamente atropelado. O pai salta para tentar salvá-lo, a mãe aparece do nada e grita seu nome desesperada. Corta para o balão vermelho subindo, como a alma de uma criança ascendendo aos céus.
A cena que muda tudo
Todo o drama da família se desenvolve à partir desse acontecimento, pois logo em seguida nos deparamos com o cotidiano de dois anos depois: uma expressão péssima no rosto do protagonista, uma casa muito inferior à outra (e sem a esposa), um relacionamento terrível com o segundo filho. Nada é explicado didaticamente, mas somos levados a crer que todos culpam o pai pelo desastre, até ele mesmo.
A cena do shopping marca uma transição fundamental no jogo, saímos de uma casa feliz para um mundo sombrio; de um universo claro e colorido para uma cidade chuvosa e ocre. É através dessa cena que conhecemos o drama do personagem principal e justificamos sua personalidade. A intensidade dramática da narrativa dá seu tom à partir dela. Porém, em Heavy Rain somos bombardeados com cenas intensas e questionadoras o tempo todo, conseguindo até transformar esta em apenas um probleminha inicial. Quem se transfere facilmente para o universo ficcional tem que se preparar para emoções fortes.
Há quem critique a cena do shopping e pinte-a como uma tentativa falha de se fazer drama. Há quem ache que se ganha muito em imersão e realismo. Tendo a achar que tudo é uma questão do quanto a pessoa se entrega à experiência, além de gostos pessoais, etc. Mas o fato é que David Cage, o diretor da obra, quis causar emoções no jogador, e pretende fazer isso mais vezes.
Leitores, o que acham da cena do shopping? Se emocionaram? Foram pegos de surpresa? Acharam bem feita ou está mais para uma banalidade clichê?
Revisão: José Carlos Alves
Capa: Leonardo Correia
Não tive a oportunidade de jogar Heavy rain pois não possuo um Play 3 mas assisti pelo menos 70% de game play através do youtube e posso garantir que é uma das maiores obras já feitas para os vídeo games! Não sei o final mas acredito que seja adequado a obra. A cena do shopping citada considero fantástica, me arrepiei a cada momento e ela é muito bem arquitetada e real... o final trágico é realmente triste e de tocar o coração de qualquer pessoa que possua um pouco de sentimento no coração!,
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