Se você é dono de um PS3 e curte um bom RPG, com certeza não ficou alheio ao lançamento de Ni no Kuni, uma clássica aventura com personagens interessantes e para lá de carismáticos. Arrisco-me ainda a dizer que toda a essência do jogo está no desenvolvimento da história desses personagens. Como não poderia ser diferente, o protagonista possui extrema importância, mas não é por isso que Oliver se destaca dos demais, e sim pelo seu carisma incomparável. Se você também ficou fascinado pela trajetória desse simpático garoto, não deixe de acompanhar nossa matéria.
Eu fiquei absolutamente fascinado quando soube do anúncio de Ni no Kuni. Não tenho certeza se foi o design, a história ou fato de ter sido produzido pela Level 5 que me deixaram com a expectativa nas alturas, talvez tenha sido tudo isso. O difícil foi ter que esperar mais de 1 ano para o lançamento ocidental.
E não preciso nem dizer que toda essa espera herculana valeu a pena. O jogo é simplesmente lindo, divertido e mais uma pá de coisas que vocês devem ter visto ao ler nossa Análise sobre ele. Mas reitero que o que mais me chamou a atenção durante toda a aventura, foram os personagens. Alguns tão complexos que não devem nada a produções literárias e cinematográficas. Oliver talvez seja o mais importante deles, mas ao contrário do senso comum, sua importância não deriva do fato de ser protagonista, e sim dos seus sentimentos, que são a mola propulsora de todo o jogo.
Atenção! Essa matéria contém alguns spoilers, leia por sua conta e risco.
Relações de afeto e a perda
Logo no início do jogo, temos contato com a vida cotidiana de Oliver, um jovem de 13 anos. A pacata rotina do garoto com sua mãe, Allie, na cidade de Motorville é suficiente para nos mostrar uma relação de amor e dedicação de uma mãe solteira que luta para criar o filho sozinha.
É nesse primeiro momento que fica nítida a ligação profunda entre Oliver e sua mãe, e de como essa relação é marcante para os dois. Oliver é um menino que aparentemente cresceu sem a figura de um pai e por isso tem uma devoção e um enorme carinho por sua mãe.
Ao mesmo tempo, vemos que o senso de aventura do jovem já faz parte de sua personalidade desde o início. Mesmo tendo toda aquela pinta de filho querido, ele sai às escondidas de sua mãe no meio da madrugada e se encontra Phil, o seu melhor amigo, para testar um novo experimento.
E como os jogos sempre nos ensinam alguma coisa, Oliver acaba se metendo em uma enrascada daquelas, e tem que ser salvo justamente por sua mãe, que pressentiu o filho em perigo e saiu desesperada em seu encontro. Com aquele clássico jargão de que toda mãe daria a vida pela do filho, após resgatar Oliver de um destino terrível, Allie acaba morrendo.
Esse é um dos momentos mais marcantes de toda a história. A vida pacata e perfeita que Oliver levava é drasticamente interrompida. E como já dizia Joseph Campbell: em toda boa história, uma tragédia é sempre necessária para que o protagonista tenha o seu “chamado da aventura”. É nesse ponto que a jornada de Oliver realmente se inicia.
O protagonista quebrado
Todo o universo de Ni no Kuni pode ser resumido em duas palavras: corações quebrados. O mal espalhado pelo mundo se alimenta dos sentimentos das pessoas, consumindo os seus corações. A grande diferença no jogo é que isso inclui o próprio protagonista.
Oliver também está com o coração quebrado. Ele é consumido pela culpa por sua mãe ter morrido, entrando em desespero. São as suas lágrimas que lhe dão a esperança, apresentada na forma de Drippy, uma fada que conta ao jovem garoto os problemas que estão acontecendo nos dois mundos. Meio receoso no início, o protagonista muda de ideia quando descobre que ajudar o mundo da fantasia é o único modo de trazer sua mãe de volta à vida.
A escolha de Oliver é importantíssima, pois nos permite perceber mais a fundo suas motivações. De início, ele concorda em ajudar apenas quando fica sabendo que pode trazer sua mãe de volta. De certa forma, o garoto parte em uma jornada dupla: salvar o mundo de Ni no Kuni e restaurar o seu coração quebrado pela morte da mãe.
As duas motivações misturam-se no momento em que Oliver conhece os problemas de Ni no Kuni. É assim que fica nítida toda a bondade do garoto. Sempre disposto a ajudar quem precisa, demonstrando respeito a quem quer que seja e, o mais importante, preocupado em recuperar os corações quebrados de todos.
A força vem de dentro
A grande sacada de Ni no Kuni é a jornada dos personagens. Oliver não é aquele típico herói dos RPGs japoneses. Ele não tem um corte de cabelo estiloso, não tem a força física ou alguma habilidade surpreendente que o faça se destacar logo no início. Suas qualidades são majoritariamente psicológicas: ele sempre foi um garoto bravo e corajoso. E são essas características que vão torna-lo essencial e inesquecível.
O mais interessante a se pensar, é que Oliver na verdade não tem escolha. Após o evento trágico da morte de sua mãe, ele está sozinho. Não tem mais ninguém. Sua única saída é fugir para um mundo de fantasia e deixar para trás a realidade cruel que o assola. E é preciso uma coragem assustadora para enfrentar o desconhecido.
Por causa de toda a sua tristeza, ele segue em frente e busca ajudar a todos. É só ao longo do seu percurso que ele desenvolve suas habilidades e aceita o seu destino como o salvador do mundo. Apesar de que, ao longo da jornada, ele percebe que também é salvo por suas escolhas. Um protagonista frágil, carismático e que desconhece sua própria força, esse é presente da Level 5 para os fãs.
A capacidade de superar as próprias dificuldades e seguir em frente, essa é a lição que Oliver nos ensina. Aquele menino de aspecto esguio, provou a todos que a verdadeira força está na vontade de superar os desafios e ajudar o próximo. Não há visual “style” no mundo que supere isso.
Capa: Felipe Araujo
Revisão: Ramon Oliveira de Souza
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