Desventuras orientais
O jogo já começa fugindo do padrão por ser um dos poucos games em mundo aberto que não ocorrem em algum cenário estadunidense ou semelhante; a brincadeira toda ocorre em território chinês, em Hong Kong.
A aventura narra a história de Wei Shen, um policial com a missão de se infiltrar em uma das maiores tríades chinesas. Tríades, para quem não sabe, é o termo utilizado no oriente para o que chamamos de gangues, bandos aqui no ocidente. A questão toda é que Wei acaba precisando agir como um bandido para manter as aparências, e isso força um conflito na mentalidade de Wei, sobre tudo o que ele acredita; o que ele deve fazer, continuar sua missão como policial ou aceitar a vida das ruas? Será que ele tem mais jeito para bandido do que para policial?
Com batalhas intensas e que por vezes coloca o jogador em desespero, o game tem uma premissa excelente e soube encaixar perfeitamente a história, seu estilo e o mundo aberto como nenhum outro título foi capaz. Mas antes de abordarmos isso, o que acham de vermos um pouco sobre o jogo em ação?
Só mais um do estilo?
Algo que o game não garante é uma jogabilidade inovadora. Praticamente tudo o que vemos aqui já presenciamos em outros games de mundo aberto. O combate corpo a corpo, por exemplo, me lembrou demais o estilo de Batman: Arkham City. O que isso quer dizer? Bem, basicamente espere o oponente atacar e aperte o botão de contra-ataque para começar um combo violento usando os muitos recursos do cenário. Não que seja um estilo ruim, muito pelo contrário, foi um dos fatores que eu mais gostei em Batman: AC, mas como eu disse, gostei disso no Batman. Eu esperava algo diferenciado aqui.
O jogo também conta com combates a distância com o uso de armas de fogo e, novamente, vemos um estilo reciclado. Não posso culpá-los, não tinha muito o que inovar com tiros em terceira pessoa, basta ver o padrão seguido por Max Payne, Gears of Wars e outros do estilo: atirar, cobrir-se, recarregar, mover-se, repita os passos. Seguindo este padrão, junto de um pouco de bom senso, tornará tudo simples.
Quanto à mobilidade, temos dois fatores importantes em Sleeping Dogs: correr e dirigir. No primeiro, admito que me lembrou Assassin's Creed: o jogo conta com movimentos que lembram parkour, abusando do cenário em corridas intensas – efeito muito bem utilizado principalmente nas fugas em locais de difícil acesso. Mesmo sendo uma mecânica reutilizada, ficou excelente nas ruas de Hong Kong. Já dirigindo, novamente lembra outros títulos do gênero, porém de forma um pouco mais polida. Não tive dificuldades para pilotar a moto em altas velocidades, por exemplo, mas o jogo possui alguns pequenos erros de física – que abordarei mais a frente.
O som do game não é algo realmente diferencial. As músicas são bacanas e realmente batem com os cenários em que aparecem, mas não é realmente o destaque do jogo. Em compensação, temos uma excelente dublagem dos personagens. Por vezes o sotaque ficou evidentemente forçado, mas ainda assim tornou a experiência mais cinematográfica e envolvente.
O título também possui um estilo de evolução interessante que envolve dois caminhos: O caminho do policial e o caminho do criminoso. Esse sistema permite que o jogador, através de missões, desenvolva as capacidades de Wei como um oficial ou como um bandido. As missões de policial envolvem aumentar a capacidade de combate à distância, com uso de armas de fogo, enquanto as de criminoso melhoram o combate corpo a corpo. Esse estilo me chamou a atenção por se envolver diretamente com a história do jogo e pelo fato de que os dois caminhos não entram em conflito, diferente de outras árvores de habilidades de jogos semelhantes; você pode ser o melhor policial possível, e ainda assim, continuar sendo um excelente criminoso.
Conflito de personalidade
Um dos aspectos mais interessantes de Sleeping Dogs é a forma com a qual o jogador começa a se identificar com Wei Shen conforme ele tenta compreender onde é o seu lugar. Como um policial, ele tem seus ideais e sua índole. Ele não gosta de agir como um bandido, mas precisa para continuar com o seu disfarce, mas e o jogador? Como ele se sente quanto a isso? As decisões que o controlador toma influenciam diretamente na mentalidade do protagonista, fazendo-o ficar cada vez mais incerto sobre o próprio futuro.
A liberdade que o jogo proporciona nas ruas de Hong Kong permite explorar ainda mais estes aspectos, conforme as missões variam de acordo com os ideais. Algo que o jogo realmente se destaca é o fato de Wei tentar se confortar ao fazer algo errado, criando desculpas para suas ações errôneas – e devo admitir, também foi capaz de me convencer de que o que estava fazendo era o correto. A índole do personagem é algo forte e que convence o jogador a manter-se nos parâmetros por ele propostos. Usando como exemplo, os jogos da série Grand Theft Auto costumam ser conhecidos por praticamente impedir o jogador de ser uma boa pessoa, muitas vezes o induzindo a ser o vilão da história. Aqui não; a Square Enix conseguiu criar um enredo em que o jogo convence o jogador que independente de suas ações, elas terão consequências boas e ruins, e que devemos pensar no personagem antes de pensar em si.
Outro fator determinante é como o fato da história ser em mundo aberto quase não prejudicou o seu enredo – ênfase em quase. É fato que jogos com esse estilo costumam acabar causando confusões, às vezes pelo conflito com os ideais do personagem e às vezes com o fato de que realmente não estamos afim de continuar a história naquele momento. O título usa de seus artifícios para tentar guiá-lo para rumar a história, mas ei, é você quem está no controle.
As missões da história foram bem colocadas e com um bom timing, dando liberdade para o jogador se aventurar pelas ruas sem ter de se preocupar que alguém vá morrer se ele não pisar fundo no acelerador. Aliás, aproveite o passeio para admirar o cenário; o game conta com realismo marcante do território de Hong Kong. A atmosfera de constante tensão só desaparece quando você finalmente sente-se livre das obrigações, tanto como policial, quanto como membro da tríade. O jogo em si é uma obra de arte, mas não passa sem as suas falhas.
Acabamento suspeito
Não, o jogo não é mais um amontoado de erros e bugs como alguns que passaram pelo console nos últimos tempos (Skyrim, estou olhando para você), porém é notável a falta de capricho e de cuidado em certos trechos da jogabilidade. Os principais problemas envolvem algo que aflige os videogames há eras: confrontar as leis da física. Tá, tudo bem que por ser um jogo ele não precisa ser tão realista, mas se a proposta do game é mostrar a realidade... Já entenderam onde quero chegar, né?
Ao abater oponentes, por exemplo, ocorreram casos onde seus corpos dobraram de formas um tanto quanto bizarras. Eu não sabia se tinha medo ou simplesmente ria da situação. Os personagens também parecem ser um tanto quanto estúpidos em certas partes, principalmente nos confrontos armados: em vez de se esconderem, correm de um lado para o outro; em vez de ocultarem-se para encontrar Wei, só faltaram colocar alvos na cabeça. Isso não é predominante de todos os confrontos, mas nas vezes em que isso aconteceu, foi frustrante.
Outra coisa que me incomodou foi quando resolvi testar o potencial da motocicleta. Eu disparei pelas ruas, indo o quão rápido podia e acabei por batendo em um carro. Wei saiu voando, a moto ficou. Acha que levei muito dano? NADA. Simplesmente me levantei, virei pra achar a moto e estava lá, intacta, de pé no meio da rua. Não que eu queira sair machucado toda vez que eu bater, ou que queira ter de comprar uma moto nova por missão, mas vamos combinar que existem certas coisas inaceitáveis se o objetivo é fazer um jogo realista.
O último aspecto negativo que fui capaz de encontrar foi a falta de memória de certos personagens. Se você tomar certa atitude, eles vão te criticar e te temer, mas após algum tempo, se você voltar e executar a mesma ação, não terá efeito. Mas neste caso é passável, porque poucos sabem a dificuldade que é de se reproduzir a natureza humana em personagens de um jogo. Fazer uma inteligência artificial instintiva a tal ponto talvez ainda esteja um pouco distante do presente. Quem sabe em breve?
Emoção do começo ao fim
Apesar dos contras, o jogo é excelente. A trama não permite que você simplesmente se canse, você começa e quer ir até o fim pra conseguir saber o que Wei fará de sua vida. Paradoxalmente, você não quer que o jogo acabe; a liberdade que ele oferece e a forma com a qual você pode ser o herói ou o vilão de um momento para o outro é realmente atraente. É o tipo de jogo que recomendo para aqueles jogadores chatos que se focam mais na história do que no resto, como eu. Se você gosta de jogos de mundo aberto, com certeza vale experimentar. Aliás, recomendo a todo o público gamer; Sleeping Dogs é um ótimo título, e vale a pena ter ele em sua coleção.
Prós
- História excelente;
- Visual maravilhoso;
- O sistema de mundo aberto foi muito bem utilizado;
- Viciante.
Contras
- Pouco inovador no quesito jogabilidade;
- Leis da física são desrespeitadas.
Sleeping Dogs - PlayStation 3 - Nota Final: 9,0Visual: 9,5 | Som: 8.0 | Jogabilidade: 8,0 | Diversão: 9.0
Revisor: Rafael Becker
Sleeping Dogs (PS3) nos foi gentilmente cedido para análise pela Iguana Mall.
Garotos, tenho um filho de 10 anos que está me torrando a paciência de tanto que pede este jogo. Pergunto: tem muitas cenas de violência além do que já vemos em Batman e GTA? Tem cenas de consumo de drogas? De sexo? O que vocês acham? Obrigada keyla
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