Silent Hill fez história e aprofundou o mundo dos games de horror em um rumo mais psicológico. Com personagens cheios de culpa e perturbados por seus traumas, a série não demorou a criar "pupilos". Rule of Rose foi um deles. Carregado de referências psicológicas, o jogo pesou a mão na violência e sexualidade e foi recebido com controvérsias por inserir crianças nesse contexto. Mas não se engane: tudo isso está ali para contar uma complexa, triste e pesada história de perda e arrependimento. Mas não se assuste tanto: você terá um companheiro canino para afastar o medo durante a jornada de Jennifer.
Um conto de fadas. E monstros.
A história começa com a jovem Jennifer acordando em um ônibus. Seu destino é desconhecido. Um garotinho entrega a ela um livro de histórias, com desenhos feitos à mão, com traços bem infantis. Ela tenta devolver a ele o livro, seguindo-o por uma trilha na floresta, apenas para encontrar um orfanato antigo.
Nesse local, Jennifer é atacada por um grupo de crianças, aprisionada num caixão e levada a um dirigível. Como as coisas não poderiam ficar mais estranhas, ela passa a encontrar monstros baixinhos e esguios, que lembram crianças, espalhados pela nave, além de um grupo de órfãos. Essas crianças endemoniadas formam um grupo chamado Aristocratas do Giz-de-Cera Vermelho, e apresentam desafios mensais a Jennifer, sempre resultando em uma punição para a pobrezinha.
A ideia parece estranha? Com o tempo, é fácil perceber que nada ali é o que parece. O dirigível começa a parecer cada vez mais com o orfanato, e as meninas vão ficando cada vez mais cruéis com Jennifer, embora ela consiga completar de forma competente todos os desafios. Os adultos do orfanato agem de forma estranha. O livro de histórias que o garotinho deu a Jennifer vai se completando, contando a história que ela está vivendo, chamando-a de "A Garota com Má Sorte". A cada mês, é perceptível que uma tragédia aguarda a protagonista.
Ah sim! No meio dessa bagunça toda, Jennifer encontra um cachorro chamado Brown, que passa a ajudá-la em seus desafios e torna-se o único amigo dela no decorrer da trama. É impossível não gostar de Brown. Ele te ajuda a localizar itens, guiar você pelos locais e até a distrair inimigos. Se fosse preciso escolher um personagem como o mais carismático, seria ele.
Junte todo o mistério com um clima lésbico entre as garotas, uma boa quantidade de sacos cheios de sangue sendo arrastados e com fortes referências a bullying e crueldade infantil e você tem um dos jogos mais pesados e menos indicados para crianças. A história de Jennifer é extremamente infeliz e deprimente. E é claro que eu não vou contar aqui a verdade por trás de toda a trama, qual seria a graça?
Desajeitado, mas agradável
Antes que você corra para o seu PS2 empoeirado para jogar Rule of Rose, saiba que a jogabilidade é cheia de problemas. Jennifer é lenta, o combate é um caos e o jogo é o símbolo de uma era dos games de horror que já passou. Digamos que Rule of Rose não envelheceu bem e parece extremamente datado hoje em dia.
Dito isso, ele não é desagradável. O combate é ruim, mas não prejudica a experiência como um todo. O ritmo da história é bom e compele o jogador a prosseguir. E o fator horror é muito bem utilizado, forçando por diversas vezes você a fugir dos locais em vez de enfrentar os monstros. Isso porque Jennifer é uma personagem mais submissa, fisicamente fraca e tem a sua disposição apenas armas de curto alcance improvisadas, como facas de cozinha e canos de ferro.
Durante os desafios, o jogo se comporta mais como um adventure do que um jogo de ação, o que é bom. Embora você tenha de se locomover indo e voltando para completá-los, há sempre algo novo no caminho para quebrar a monotonia.
Um clima 30's
Algo importante na ambientação de Rule of Rose é que o jogo se passa nos anos 30. As roupas dos personagens, a mobília, a trilha sonora e até a imagem do jogo lembram essa época.
É claro que, tendo sido desenvolvido por japoneses, o jogo carrega muitas influências orientais. Os diálogos possuem um jeito dramático que é bem característico dos RPGs japoneses, e algumas referências culturais podem passar batidas. Mesmo assim, a Punchline conseguiu misturar o clima assustador com um certo charme antigo, e a ambientação ficou bastante convincente.
Embora muitas músicas se repitam durante o jogo, e os ambientes quase não tenham um fundo musical propriamente dito, há algumas pérolas espalhadas pela trilha sonora, como Love Suicide, o tema da história. Acredite: se você terminar o jogo, vai ficar um pouco emocionado toda vez que ouvir a música. A dublagem, quando existente, é aceitável. O que não dá para engolir são os sons ambientes e barulhos dos monstros.
Para completar, tudo no jogo lembra o universo infantil. Até o menu é feito como um desenho de criança. E é interessante perceber como tudo isso tem relação com a história de Rule of Rose. Embora seus gráficos sejam datados, as cenas em CG são muito bonitas (se é que ver uma garota tendo um rato esfregado no rosto pode ser chamado de bonito).
Memorável
Rule of Rose definitivamente não é o melhor survival horror lançado para o PS2. Sua jogabilidade é difícil de engolir, mesmo para a época. Mas isso não tira o brilho de uma história tão bem construída e complicada, e a forma genial como foi apresentada. Se algum jogo merece que você desenterre seu console antigo, é ele.
Revisão: Catarine Aurora
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