Um soldado espartano amargurado por seu tenebroso passado. Um trato com um deus olímpico que marcaria sua vida com sangue e morte. E uma jornada de vendeta em uma tentativa desesperada de expurgar os fantasmas de seus atos, que culminaria na queda de um deus e na ascensão de outro.
Com essa premissa se inicia uma das mais incríveis, emocionantes e sanguinolentas sagas já vistas em um jogo de videogame. Lançado em 22 de março de 2005, God of War sai do estúdio Sony Santa Monica e ganha o mundo com um excelente enredo ambientado na Mitologia Grega, suas lendas e personagens. O primeiro jogo da série - lançado para o imortal PlayStation 2 - foi uma grata surpresa vinda da mente de David Jaffe e sua equipe, consagrando-se como um título aclamado pelo público e conquistando diversos prêmios da crítica especializada.
A serviço dos deuses. Motivado por vingança!
Contada de forma não cronológica, a estória se inicia com o protagonista contemplando o vazio do alto de um penhasco. Angustiado por se dar conta de que foi enganado pelos deuses, Kratos não vê outra solução para dar fim a seu martírio senão tirar a própria vida. Em um derradeiro passo o espartano se joga ao mar, buscando alívio em sua morte.
A cena corta para os eventos ocorridos 3 semanas antes, em meio as tempestuosas ondas do Mar Egeu. Kratos havia recebido de Poseidon a missão de eliminar a Hidra, que destruía os barcos e navios de marinheiros e pescadores e, no momento, dizimava os soldados do exército de Esparta, afundando suas embarcações.
Momentos depois de obter sucesso, Kratos questiona Atena sobre quando finalmente conseguiria se livrar dos fantasmas de seu passado, que tanto atormentam sua mente. Antes de (talvez?) conceder seu desejo, a deusa da guerra e da sabedoria pede para que o fantasma de Esparta se dirija à cidade de Atenas, que se encontra sob o cerco dos exércitos do deus da guerra Ares. Kratos assim o faz, dando mais um passo em direção a uma aventura repleta de ação, criaturas fantásticas, divindades enfurecidas e um banho de sangue!
Alma de clássico, com cara nova (e ensanguentada)
Um dos maiores méritos de God of War, sem dúvida, foi renovar um gênero de games de muito sucesso no passado, mas até então bastante esquecido pela indústria: o gênero beat'em up - o famoso "briga de rua", ainda que haja jogos ambientados em diversos cenários, não somente em cenários urbanos. Além disso, de forma similar ao que vemos na trilogia Prince of Persia (da Ubisoft), God of War intercala momentos de pura ação com solução de quebra-cabeças.
Outra característica marcante em God of War é a sua extrema violência, explorada a exaustão e presente nos mínimos detalhes. Desde a selvageria e brutalidade dos movimentos de Kratos ao derrotar seus inimigos, ao design de vários de seus quebra-cabeças - alguns deles exigem que se use um cadáver humano jogado num canto da sala para concluí-los - sempre haverá sangue voando pela tela com o cortar das Lâminas do Caos (Blades of Chaos) do guerreiro Espartano. God of War conta também com uma coleção formidável de armas e poderes mágicos a serem coletadas ao longo do game, como o Zeus' Fury, a Meduza's Gaze, a Blade of Artemis e muitas outras!
Acompanhando sua ágil jogabilidade, God of War implementou os Quick Time Events (QTE), em que o jogador tinha que apertar determinados botões em momentos específicos, que faziam Kratos executar ações coreografadas como finalização para derrotar inimigos mais fortes, adicionando um clima cinematográfico à ação do jogo. Tal elemento da jogabilidade representou uma inovação jamais vista antes em games desse estilo e foi tão significativo para a experiência de jogo que diversas outras produtoras também resolveram usar os QTEs.
Panteão e Teogonia
Um bom enredo não é nada sem personagens marcantes, ainda mais quando se trata de algo baseado em mitos e lendas que já foram explorados à exaustão pela indústria do entretenimento, como é o caso da Mitologia Grega. Ainda bem que o Sony Santa Monica sabe disso e fez questão de criar um "elenco" bastante carismático, desde os personagens principais até os que possuem uma breve - porém em muitos casos importante - participação. Mesmo os deuses, titãs e demais criaturas fantásticas mais importantes foram representados de maneira bem interessante. Vamos relembrar alguns deles:
Kratos - Nascido e criado em Esparta, este destemido general foi enganado pelo deus da guerra, Ares, a quem havia jurado lealdade em troca da vitória sobre os soldados bárbaros que estavam exterminando o exército espartano. Cego por sua selvageria e sede de sangue, Kratos acaba matando sua esposa e filha enquanto chacinava os moradores de um vilarejo em Atenas. Ao perceber o erro cometido, Kratos jura vingança contra o atual deus da guerra, ao passo que o ancião da vila o amaldiçoa impregnando as cinzas de sua família em seu corpo. Deste dia em diante, Kratos passa a ser conhecido com o Fantasma de Esparta.
Atena - Deusa da guerra, da sabedoria, da força e da justiça. Com a promessa de eliminar as terríveis lembranças do assassinato de sua família, Atena ordena Kratos a iniciar uma jornada em busca da Caixa de Pandora, que concede àquele que a abre o poder de destruir um deus. Além disso, Atena serve como sua guardiã e conselheira em sua jornada para acabar com Ares.
Ares - O impiedoso deus da guerra da Mitologia Grega, que ludibria Kratos fazendo com que ele acabe assassinando sua esposa e filha em um vilarejo da cidade de Atenas. Como justificativa, Ares diz a Kratos que isso foi necessário para torná-lo o guerreiro perfeito, mas o que o deus da guerra meramente consegue é um inimigo sedento de vingança, que representaria uma séria ameaça a sua permanência no Olimpo.
Cronos - Líder dos titãs, Cronos os comandou em uma grande guerra contra os deuses do Olimpo. Como punição, Zeus o condenou a vagar pelo Deserto das Almas Perdidas (Desert of Lost Souls) carregando o Templo de Pandora preso em suas costas até que os ventos incessantes e as açoitantes areias do deserto arrancassem a carne de seus ossos.
Pathos Verdes III - Principal arquiteto e servo leal dos deuses do Olimpo, Pathos Verdes III foi o responsável pela construção do Templo de Pandora, que guarda a mística Caixa de Pandora. Seu trabalho foi tão cruel e árduo e o Templo se tornou tão absurdamente complexo que o arquiteto perdeu gradativamente sua sanidade, tendo matado sua família e, por fim, cometido suicídio ao concluir seu trabalho.
O coveiro - Certamente um dos personagens mais misteriosos do jogo, o coveiro surge cavando uma profunda sepultura em frente ao Templo do Oráculo em uma passagem de God of War, que mais tarde descobre-se ser uma passagem por onde Kratos escapa do Submundo (o reino do deus Hades). Motivo de controvérsia em discussões entre fãs da franquia, especula-se que o coveiro seria na verdade Zeus, o soberano do Olimpo, que estaria disfarçado para ajudar Kratos, mal sabendo a ameaça que o Fantasma de Esparta lhe representaria futuramente.
Arquitetura divina
God of War recria de forma primorosa vários locais característicos da Mitologia Grega, como a cidade de Atenas, o Monte Olimpo, o Templo do Oráculo, os domínios do deus Hades e vários outros. Em todos eles é notável a riqueza de detalhes, mesmo este primeiro game não tendo uma qualidade gráfica tão caprichada quanto o PlayStation 2 é capaz de oferecer.
Apesar de os gráficos serem em geral opacos e escuros em diversos locais, God of War ainda conseguia impressionar pela arquitetura de suas locações. Destaque para o Templo de Pandora e seus quebra-cabeças e desafios bastante engenhosos, que referenciavam a insanidade progressiva que afligia seu criador, tornando-se mais e mais difíceis com o progresso do jogador.
A arte das musas
Claro que um jogo como esse não teria tanta graça se a trilha sonora não correspondesse à qualidade geral. Com composições orquestradas e épicas, God of War apresenta músicas dignas de produções hollywoodianas, lembrando muito os trabalhos vistos em Troia, 300 e outros grandes filmes épicos.
Composto basicamente por músicas incidentais - cujo clima que passavam dependia das locações e representavam batalhas ou lugares sombrios - a diversas variações da música tema de Kratos, The Vengeful Spartan (que toca na apresentação da tela de título), o repertório de God of War era de uma qualidade impressionante, usando e abusando de instrumentos de percussão e de sopro e envolvendo o jogador completamente, com sinfonias às vezes tão sutis quanto a doce voz de Atena e tão violentas quanto os golpes desferidos pelo Fantasma de Esparta.
Trilhe seu caminho pela Grécia Antiga
God of War foi mais do que um excelente beat'em up para um console memorável: foi o cumprimento da promessa que David Jaffe havia feito a si mesmo e à indústria de games, de tentar revolucionar um gênero que era muito pouco explorado na sexta geração de videogames. Disponível atualmente como parte do pacote God of War Collection para PS3, God of War é garantia de muita diversão e esmagar de botões. E felizmente esse foi apenas o comecinho dessa grande saga!
Revisão: Alberto Canen.
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